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Usando o Conceito de Taxa Base para Comparar Rodadas de Investimento VC em Diferentes Geografias

Geralmente, os founders já têm formado seu inside view sobre a rodada, ou seja, a partir da experiência própria já calcularam quanto, onde e como gastar, além do valuation para ancorar a discussão. Do outro lado da mesa, os investidores também têm seus inside views sobre as mesmas questões, porém têm mais dados porque negociam com inúmeras startups, e fazem ajustes necessários nos seus respectivos modelos analíticos para a comparação. E qual seria o Outside View, ou referências históricas, dessas 2 variáveis?
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Usando o Conceito de Taxa Base para Comparar Rodadas de Investimento VC em Diferentes Geografias
Usando o Conceito de Taxa Base para Comparar Rodadas de Investimento VC em Diferentes Geografias

Foto de Karla Hernandez no Unsplash
People who have information about an individual case rarely feel the need to know the statistics of the class to which the case belongs.”¹

Acordei em um belo dia sonhando em ser o campeão mundial de solução do Cubo de Rubik 3x3x3. Claramente tenho habilidades para tal — coordenação motora, matemática, minha mãe me apoiando — apesar de nunca ter conseguido resolver nenhum, independentemente do tempo. Então, só me falta saber quem eu tenho que bater nos ringues de tal esporte radical, e por quanto.

Outro ponto interessante seria entender como foi a evolução desses resultados, que poderia me ajudar a estimar como teria que ser o meu desenvolvimento relativo (a partir do meu incrível 0 número de soluções, a evolução necessária tenderia ao infinito).

Em uma pesquisa rápida no Google, descobri que existe um australiano, praticamente uma máquina de títulos australiana, chamado Feliks Zemdegs, que, desde 2010, detém 13 dos últimos 14 títulos mundiais.

Respirei fundo, pensei bem e me perguntei: faria mais sentido começar com um projeto mais simples antes de buscar o meu título mundial? Deveria tentar um campeonato na América do Sul antes, preparando o terreno para aterrorizar os recordes do Feliks? Fui olhar alguns dados, em busca da luz divina.

Comparando os recordes atuais:

  • Mundo: 5,53 segundos de média do evento, Feliks Zemdegs (🇦🇺);
  • América do Sul: 7,35 segundos de média do evento, Caio Sato (🇧🇷).

Comparando a evolução histórica dos recordes:

  • Mundo: queda anual de 7,72% de 2003 até 2019;
  • América do Sul: queda anual de 6,13% de 2007 até 2019, além de ser 23% mais lenta na média histórica.

A partir da análise das taxas base acima, pensei mais um pouco e, apesar da frustração da minha mamãezinha, em um esporte referência, em que talento influencia bem mais que sorte, percebi que eu não seria competitivo suficiente em lugar nenhum no disputado, e radical, universo de solução de cubo de Rubik 3x3x3. Avisei para a família que iria em busca de algo mais simples: investir em venture capital.

O contexto irônico acima serve para exemplificar o exercício analítico de usar taxas base para ajudar nas tomadas de decisão. Uma grande referência em processo analítico para investimentos em geral, Michael Mauboussin, estima que essa seria a mais importante ferramenta que gostaria de saber desde o início de sua jornada profissional, se pudesse voltar no tempo. Sobre esse assunto, recomendo o artigo/livro dele, The Base Rate Book. Tem muita coisa legal ali: a explicação da dicotomia Inside View (experiência e informação própria) vs. Outside views (taxas bases históricas da variável discutida) e debates sobre questões fundamentais vs. circunstanciais, além, para sua referência, da incrível quantidade de dados das taxas bases de diferentes setores.

Agora vamos usar esse framework, de taxas base, para ajudar em algo mais complexo: discussão sobre o tamanho e o valuation da rodada de seed entre empreendedores e investidores.

Geralmente, os founders já têm formado seu inside view sobre a rodada, ou seja, a partir da experiência própria já calcularam quanto, onde e como gastar, além do valuation para ancorar a discussão. Do outro lado da mesa, os investidores também têm seus inside views sobre as mesmas questões, porém têm mais dados porque negociam com inúmeras startups, e fazem ajustes necessários nos seus respectivos modelos analíticos para a comparação. E qual seria o Outside View, ou referências históricas, dessas 2 variáveis?

Vamos ajudar em 2 artigos, começando com o tamanho do ticket neste. Mas antes de irmos para os dados, vale uma nota da evolução da rodada de seed no Brasil:

Frequência

Segundo os dados da Distrito Dataminer, representando o Brasil, temos uma evolução de 26 negócios reportados no ano inteiro de 2011 para 213 em 2020. Isso equivale a um crescimento anual médio composto (CAGR) de aproximadamente 26,33% no período, e indica que estamos caminhando para uma rodada de seed sendo reportada a cada 2 dias!

Comparando com dados globais e dos EUA, temos:

  • De acordo com a Crunchbase PRO (representando o mundo): de 2.634 em 2011 para 6.302 em 2020, CAGR de 10,18%. Temos, aproximadamente, 17 rodadas de seed reportadas por dia;
  • PitchBook (representando EUA): de 1.211 em 2011 para 2.972 em 2020, CAGR de 10,49%. Temos, aproximadamente, 8 rodadas de seed reportadas por dia.

Legal verificar que, no Brasil, estamos com um crescimento composto anual bem maior, caminhando para diminuir a diferença com o resto do mundo. Então, independentemente dos motivos (mais negócios reportados e/ou mais negócios sendo feitos), temos uma indicação positiva dessa variável para ambos empreendedores e investidores brasileiros.

Total de capital alocado na rodada

Agora, analisando as informações reportadas de montante alocado na rodada.

Apesar de o Brasil ser ainda pouco representativo em termos de capital alocado (eixo secundário, direita olhando para o gráfico), nota-se que o crescimento relativo do nosso ecossistema está maior que o resto do mundo, desde 2011.

Na mesma linha que a frequência, é interessante verificar que estamos com um crescimento composto anual bem maior, a caminho de diminuir a diferença no capital alocado. Mais uma indicação positiva para o ecossistema brasileiro de venture capital.

Tamanho do ticket

Quando analisamos quanto se levanta de capital por rodada de seed, temos uma variável mais polêmica para se analisar.

Premio de Fundraising é a diferença relativa entre o quanto de capital foi levantado pelo grupo do primeiro quartil (melhor) e o de ultimo quartil (pior).

Conclusões & Inferências

Portanto, de acordo com os gráficos e dados acima, podemos inferir que:

  • Em termos nominais, a mediana de capital levantado na rodada de seed nunca foi tão alta no mundo, mas no Brasil o crescimento foi mais acentuado em reais do que em dólares;
  • Analisando o Prêmio de Fundraising Relativo: os melhores empreendedores, no trabalho de levantamento de capital, têm feito mais diferença relativa no mundo e no Brasil do que nos EUA;
  • A mediana do ticket americano é muito maior que no resto do mundo. Isso é bem relevante para startups com planos globais na largada e/ou com recursos dolarizados. Neste ponto ainda tem o fato de que a diferença deveria ser maior, dado que o Crunchbase PRO, fonte dos dados globais, inclui os dados americanos.

Pronto: agora empreendedores sabem como comparar o tamanho do seu ticket com uma Taxa Base e têm um indicativo da importância do fundraising em um negócio com a dinâmica do venture capital. E os investidores vão ficar mais felizes ao receber seus futuros sócios já com dados de mercado, bem embasados para a discussão sobre a rodada. Falei que esse negócio de venture capital ia ser mais fácil que disputar os campeonatos mundiais de solução de Cubo de Rubik 3x3x3.

No próximo texto, usaremos este framework de taxas base para analisar as comparações de valuation por geografia. Até lá!

1: Daniel Kahneman, Thinking, Fast and Slow (New York: Farrar, Straus and Giroux, 2011), página 249

Cassio Azevedo

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