Conhecimento Para Founders

Marketplaces - A equação do take rate

Imagine que um marketplace é um país. Seu PIB é o GMV (Gross Merchandising Value), que é o total de volume transacionado por essa economia. Sua receita (ou arrecadação) seria o take rate, isto é, a taxa que é cobrada por cada transação. Logo, take rate é o imposto que os marketplaces cobram para que você esteja habilitado a participar daquela economia virtual.
Reading Time:
tempo de leitura:
5
MInutes
minutos
Marketplaces - A equação do take rate
Marketplaces - A equação do take rate

Imagine que um marketplace é um país.

Seu PIB é o GMV (Gross Merchandising Value), que é o total de volume transacionado por essa economia.

Sua receita (ou arrecadação) seria o take rate, isto é, a taxa que é cobrada por cada transação.

Logo, take rate é o imposto que os marketplaces cobram para que você esteja habilitado a participar daquela economia virtual. E esse número nos diz muito sobre a empresa, como pontuou Willy Braun: “Take Rate é um bom indicador de poder de negociação: significa que quanto mais alto o take rate, maior e mais exclusiva é a proposta de valor da empresa em determinado segmento”.

O curioso é que para as diferentes economias virtuais o take rate varia muito:

Se você quiser participar do luxuoso país das hospedagens chamado Airbnb, você precisará pagar uma taxa de 15%.

Se você quiser participar do efervescente país do comércio chamado Mercado Livre, esteja disposto a pagar 11% de todas as suas transações.

Se você quiser visitar o nebuloso e exotérico país do OnlyFans, esteja preparado para pagar 20% da sua economia.

Taxas cobrados por plataformas brasileiras e globais (valores estimados):

Taxas cobrados por plataformas brasileiras e globais (valores estimados):

E são justamente essas percentagens que me fizeram me perguntar quais são as razões para que cada plataforma tenha um imposto diferente.

Uma das respostas pode estar na fórmula de Take Rate criada por Lenny Rachitsky (Product Lead Airbnb + Lenny Newsletter):

Take Rate = Conveniência + Demanda — Competição

  1. Conveniência: Refere-se ao quão mais fácil é para seu cliente utilizar os serviços do seu marketplace para executar as suas atividades (quanto mais, melhor).

Um dos melhores exemplos é o Enjoei. Dentro da sua oferta de serviços, a empresa detém duas possibilidades:

  • O serviço tradicional do enjoei incorre uma taxa média de 20% mais uma taxa entre 1 e 13 reais por item.
  • Já o serviço Enjoei Pro é auto explicativo na sua descrição do site: “O Enjoei pro é um serviço do Enjoei para quem quer vender, mas não tem tempo de cuidar da sua lojinha”. A empresa fotografa, despacha e cuida da venda. Em troca da conveniência, o vendedor ou a vendedora paga uma taxa de 50% mais uma taxa fixa que varia de 5 a 13,50 reais por item.

Ou seja, quanto maior a conveniência e quanto maior a gestão da plataforma na transação, maior também o take rate do marketplace. O trade off é que na maioria dos casos a gestão do marketplace acaba por gerar mais fricções no processo e diminui o efeito de rede da plataforma.

As plataformas que acabam por buscar um maior controle da experiência são chamadas Marketplaces gerenciados.

2. Demanda: O quanto de demanda valiosa a plataforma gerará para o supply (quanto mais, melhor)

Take Rate são taxas cobradas por entidades que conectam duas partes e o Shopify se enquadra nesse perfil (ele não é um marketplace puro mas o seu negócio é habilitar duas entidades diferentes). O Shopify cobra um take rate de 2–4% + uma mensalidade variável. O Mercado Livre cobra uma taxa média de 11%. Uma das razões pela diferença do take rate é que a plataforma do Mercado Livre tem como principal fortaleza a geração de demanda enquanto que o Shopify não atua nessa frente.

3. Competição: O quão competitivo é o mercado (quanto menos, melhor)

O último investimento early stage significativo feito em uma empresa como modelo de negócio similar ao Uber no Brasil foi feito em 2015 no series A da 99. Desde então, não houve novas empresas tentando empreender pela simples razão de que o mercado foi dominado pelo Uber e pela 99 (Didi). A mesma analogia pode ser contextualizada para a disputa Rappi x Ifood. Se por acaso surgisse uma nova empresa, ela provavelmente teria take rate zerado (e muito dinheiro na conta) para conquistar um pouco do mercado da forma que ele é desenhado hoje. (salvo a exceção de algo muito diferente)

Esses exemplos ilustram que a competição feroz que vemos em alguns segmentos resulta na diminuição do take rate. Quanto mais competição, menor o take rate.

No seu artigo sobre o assunto, Lenny Rachitsky elucida essa fórmula com os seguintes exemplos:

  • Gumroad (8.50%): High convenience + Little demand gen — Medium competition
  • StockX (~11%): High convenience + High demand gen — Medium competition
  • Substack (~13%): Very high convenience + Little demand gen — Medium competition
  • Airbnb (15%): High convenience + Very high demand gen — High competition
  • OnlyFans (20%): Very high convenience + Little demand gen — Very low competition
  • Cameo (25%): High convenience + Very high demand gen — Very low competition
  • Twitch (50%): Very high convenience + Very high demand gen — Very low competition

Além da fórmula, vou pontuar outros 2 fatores que levam a alterações na taxa do take rate:

  1. Margem Bruta do Produto Transacionado

Há dois tipos de produtos: Digitais e Físicas/Presenciais.

A beleza do produto digital é que ele tende a ter o custo marginal igual a 0, ou seja, para cada vez que o produto precisa ser replicado, não é preciso ter custo adicional. Um exemplo é uma música, um curso assíncrono, um livro físico, um jogo desenvolvido.

Já produtos físicos e presenciais detém um custo marginal. Por exemplo, para cada nova reserva no Airbnb os anfitriões têm um custo relacionado (COGS). Dito isso, para mercados de margens baixas, será mais difícil de se imputar take-rates altos.

2. Concentração de fornecedores ou clientes

Para qualquer marketplace, quanto mais fragmentado são os fornecedores, melhor. Se o supply tiver uma alta concentração na mão de poucos fornecedores, eles terão o poder de barganhar/negociar e eventualmente o take rate deverá ser reduzido pois eles terão um controle excessivo da experiência.

Um dos melhores exemplos que é extensamente documentado é o caso da Expedia, que vende tanto reservas em hotéis quanto passagens aéreas. Temos milhares de hotéis pelo mundo e apenas algumas companhias aéreas. Devido ao poder das companhias aéreas, o take rate da empresa nesse segmento era de apenas 4% enquanto que no caso dos hotéis, no qual a oferta era fragmentada, o take rate era em média de 15%.

Tão complexa quanto a discussão sobre qual o imposto ideal que um governo deve cobrar é também a discussão sobre a taxa de take rate. Cada realidade, estágio da empresa e projeto demanda uma reflexão. Assim como na economia real, mudanças marginais podem ter alto impacto na economia transacionada e no incentivo tanto a demanda quanto a oferta

My 2 cents é que a discussão sobre take rates será aprofundada ao longo dos próximos anos, a medida que vemos mais empresas de Software as a Service e Consumo adotando o conceito de plataforma, no qual a monetização ocorre usualmente via take rate.

Não é por acaso que uma empresa de consumo como a Amaro lançou o seu próprio marketplace ou que um SaaS como a Omie está se direcionando para a vida financeira das PMEs através do OmieCash. Em todos os casos, a discussão de take rate será muito mais ampla do que apenas no mercado de marketplaces “tradicionais”, uma vez que a maior parte das empresas estão se direcionando a ser plataformas, isto é, habilitadores de transações entre duas partes.

Para se aprofundar:

Lenny Rachitisky — Lista de take rates

Bill Gurley — A Rake Too Far: Optimal Platform Pricing Strategy

Lenny Newsletter — Choosing a take rate (versão pdf)

Tannay Newsletter — Marketplace takes rate factors

Next Episode

Próximo Episódio

No items found.